terça-feira, 28 de junho de 2011

A violência doméstica é tão cruel com á vitima que elas terminam por se identificarem e até mesmo defender aquele que a agride

A violência doméstica é tão cruel com á vitima que elas terminam por se identificarem e até mesmo defender aquele que a agride, em um gesto desesperado e em geral inconsciente de preservação pessoal.


A traumática situação á longo prazo que não se encerra no final da crise, e a vitima tem consciência disso, as mulheres tem consciência que depois dos momentos de “lua de mel” vem outra crise, faz com que a vitima passe a defender o monstro na tentativa de salvar sua vida.

O relacionamento entre vitima e agressor é um relacionamento de severo desequilíbrio de poder no qual o monstro dita aquilo que a vitima pode ou não fazer. A vitima é constantemente ameaçada de danos físicos e até de morte pelo monstro. O instinto de auto-preservação vem a tona por parte da vitima.

A crença (correta ou não) na total impossibilidade de fuga, o que significa que a sobrevivência precisa ocorrer nos termos e regras impostos pelo monstro todo poderoso, o isolamento da vitima com relação as pessoas que não estão cativa, impede que a visão externa quanto ao monstro interfira no processo de preservação.

Funciona mais ou menos assim:


Uma mulher se vê prisioneira de um homem que a ameaça de morte caso ela desobedeça. A mulher sofre abusos – físicos/sexuais/verbais – e começa a enfrentar dificuldades para pensar direito. De acordo com o monstro agressor, é impossível ela escapar. A ameaça de morte é constante explicita ou velada. Sua família, seus filhos também recebem ameaças. A sua única chance de sobrevivência é a total obediência.
Com o passar do tempo, a obediência por si, torna se algo menos seguro – já que o monstro agressor também sofre estresse, e uma mudança em seu humor poderia representar conseqüências desastrosas para á vitima. Compreender o que poderia deflagrar atos de violência da parte do monstro agressor, para evitar esse tipo de atitude, se torna uma segunda estratégia de sobrevivência. Com isso, á vitima aprende a conhecer quem a capturou.

 Um gesto de gentileza por parte do monstro agressor pode ser o ato de ainda manter a vitima viva, o que faz com que ela comece a acreditar que na realidade ele é seu salvador. Em ultima análise ela começa a acreditar que ele é “bom”. Vivendo em circunstâncias traumáticas e ameaçadoras, a vitima acredita que o menor gesto de gentileza - ou mesmo a súbita ausência de violência por algum tempo, como um ato de amizade em um mundo de outra forma hostil e aterrorizante, e ela começa a se apegar no monstro agressor com fervor.



Lentamente o monstro agressor começa a parecer menos ameaçador – que é outro instrumento de sobrevivência e proteção do que o dano pode causar a nossa vida – a vitima sofre de uma ilusão auto-imposta, a fim de sobreviver psicologicamente, fisicamente, e a fim  de reduzir o inimaginável estresse da sua situação  












A vitima passa a acreditar verdadeiramente que o monstro agressor é seu amigo, que não á matara, e que ambos podem se ajudar mutuamente a “sair dessa encrenca”. 


As pessoas do lado de fora que se esforçam por resgatar a vitima parecem-lhe menos aliados, porque querem ferir a pessoa que a protege contra todos os males. O fato de que a pessoa em questão seja ela mesma a potencial origem desses males termina ignorada em meio ao processo de auto-ilusão.

As tentativas de libertação são, por esse motivo, vistas como uma ameaça, porque a vitima pode correr o risco de ser magoada. É importante notar que os sintomas são conseqüência de um stress físico e emocional extremo. O complexo e dúbio comportamento de afetividade e ódio simultâneo junto aos monstros agressores é considerado uma estratégia de sobrevivência por parte das vítimas.



  
É importante observar que o processo da síndrome ocorre sem que a vítima tenha consciência disso. A mente fabrica uma estratégia ilusória para proteger a psique da vítima. A identificação afetiva e emocional com o monstro agressor acontece para proporcionar afastamento emocional da realidade perigosa e violenta a qual a pessoa está sendo submetida. Entretanto, a vítima não se torna totalmente alheia à sua própria situação, parte de sua mente conserva-se alerta ao perigo e é isso que faz com que a maioria das vítimas tente escapar do monstro agressor em algum momento, mesmo em casos de cativeiro prolongado. É comum no caso de violência doméstica e familiar em que a mulher é agredida pelo marido e continua a amá-lo e defendê-lo como se as agressões fossem normais. 





Fonte:(http://www.araretamaumamulher.blogspot.com/)




quinta-feira, 23 de junho de 2011

Violência contra a mulher

Por: Isabel C. S. Vargas
A lei 11.340 de agosto de 2006, criou mecanismos visando coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Assegura em seu art.2º oportunidades e facilidade para viver sem violência, preservar a saúde física e mental, o seu aperfeiçoamento intelectual e social, independente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião. 

Incumbe a família, a sociedade e ao poder público criar condições necessárias para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. 

Ao poder público caberá o desenvolvimento de políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres, no âmbito das relações domésticas e familiares, no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 

A lei avançou ao dispor sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher. 
Enumera em seu art. 5º o que se configura como violência contra a mulher. Outro dado importante é o fato de não ser necessário que seja estabelecido vínculo familiar, no âmbito da unidade doméstica. 

Em seu art. 7º define quais são as formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, ou seja, a violência física, psicológica, sexual, patrimonial, e moral. 
Em seu corpo a lei ainda estabelece sobre a assistência à mulher, medidas integradas de prevenção, da forma do atendimento da autoridade policial, os procedimentos referentes ao juizado, além de medidas protetivas da ofendida, entre outros. 

O aspecto ao qual desejo me reportar desta lei é o que se refere aos direitos humanos, pois a violência doméstica e familiar contra a mulher é uma forma de violação dos direitos humanos. Isto nos leva considerar que a educação em direitos humanos pode auxiliar no combate à violência contra a mulher e na diminuição de outras violações aos direitos humanos, visto que compreende etapas de sensibilização, problematização, promove a educação para a justiça social e para a paz, desenvolvendo nos indivíduos uma noção ético-social em defesa da vida e da preservação da espécie humana. 

Deve-se educar em direitos humanos na família, através de posturas claras, dissociadas de preconceito; na escola através da multiplicidade de ações incluindo educação em direitos humanos para os educadores, cujos conceitos serão exercitados no cotidiano com seus alunos, conduta esta que se multiplica na convivência com os colegas, com a família e na comunidade na qual estão inseridos. 

É dialógica e interdisciplinar e pressupõe enquadramento do cotidiano nas ações. 
Educação em direitos humanos constrói novos modos de pensar, ensina a respeitar o outro com suas diferenças, forma hábitos e atitudes, sensibiliza para a relação com o outro, cria novos modos de convivência social, provoca mudanças para que se superem e se rejeitem as violações. Cria vínculos. 

No aspecto das relações pessoais, a educação em direitos humanos proporciona o desenvolvimento de atitudes tais como: saber ouvir o outro, aprender a respeitar as discussões, comprometimento com as mudanças, bom senso, exercício de tolerância, respeito ao saber do outro, rejeição às formas de discriminação, desenvolvimento de mecanismos de reconhecimento de si e do outro como pessoa e cidadão, diante de processos e práticas violadoras dos direitos. 

Podemos observar, então, que a educação em direitos humanos proporciona a criança, ao jovem e consequentemente ao adulto futuro, posicionar-se como um ser comprometido com melhor convivência, mais justiça, transformando-os em atores principais do desenvolvimento pessoal, social vivendo de forma a coibir, naturalmente a violência. 

Fonte: Lei 11.340/2006 
A Educação em Direitos Humanos 
Zenaide, M. de Nazaré

Secretário da ONU recebe 56 mil assinaturas de homens brasileiros pelo fim da violência contra as mulheres

(ONU Mulheres) Em visita ao Brasil, o Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon, recebeu documento contendo 56 mil assinaturas de homens brasileiros coletadas pela campanha “Homens Unidos pelo Fim da Violência contra as Mulheres”, liderada pela Secretaria de Políticas para as Mulheres. O abaixo-assinado foi entregue pela ministra Iriny Lopes, da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), que assim reforçou o compromisso do governo brasileiro com a erradicação da violência contra as mulheres e o envolvimento de novos atores nesse esforço.

A lista com os nomes dos homens brasileiros vai fazer parte do contador mundial de assinaturas e ações impulsionadas pela campanha do Secretário-Geral “UNA-SE pelo fim da violência contra as mulheres".

As assinaturas foram coletadas pela internet, numa demonstração do compromisso público de líderes políticos, atletas, artistas e milhares de anônimos com a implementação integral da Lei Maria da Penha e a efetivação de políticas públicas voltadas para a eliminação da violência contra as mulheres. A iniciativa foi desenvolvida em parceria com a ONU Mulheres, UNFPA (Fundo de População das Nações Unidas), Instituto Papai, Instituto Promundo e Agende – Ações em Gênero e Cidadania.

Entre as 56 mil assinaturas, estão a do ex-jogador Raí, do cantor Sérgio Reis, do ex-presidente Lula e de centenas de autoridades políticas e homens líderes. Iniciativa marca também reforço, no Brasil, da campanha do Secretário-Geral pelo fim da violência contra as mulheres

UNA-SE: uma campanha global
A campanha do Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, UNA-SE pelo fim da violência contra as mulheres, tem por objetivo prevenir e eliminar a violência contra as mulheres e meninas em todas as partes do mundo.

A UNA-SE convoca os governos, a sociedade civil, as organizações de mulheres, os jovens, o setor privado, a mídia e todo o Sistema ONU para unir forças na erradicação do fenômeno global da violência contra as mulheres e meninas. Até 2015, a UNA-SE pretende atingir cinco objetivos em todos os países:
• Adotar e fazer cumprir leis nacionais para combater e punir todas as formas de violência contra mulheres e meninas. 
• Adotar e implementar planos de ação nacionais multissetoriais. 
• Fortalecer a coleta de dados sobre a propagação da violência contra mulheres e meninas. 
• Aumentar a consciência pública e a mobilização social. 
• Erradicar a violência sexual em conflitos. 

fonte:(www.agenciapatriciagalvao.org.br) por ONU Mulheres.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Casos de feminicídio crescem e são marcados por fúria e crueldade

Natasha Pitts
Jornalista da Adital

Adital
O combate e a redução dos feminicídios têm se mostrado um grande desafio para os países centro-americanos, entre eles, El Salvador, onde pelo menos uma mulher é vitima fatal da ação violenta de um homem a cada dia. Dados apresentados no Relatório Nacional sobre a situação de violência contra as mulheres, do Instituto Salvadorenho para o Desenvolvimento da Mulher (Isdemu), comprovam que este crime de ódio vem crescendo no país.
Apenas nos 12 meses de 2010 552 mulheres foram mortas de forma violenta em El Salvador. A quantidade de casos ultrapassou os 540 registrados em 2009. De acordo com a Fundação para a Democracia, Segurança e Paz (Fundemospaz), o aumento está sendo progressivo, visto que nos três últimos anos os casos cresceram 64%. De 28 casos mensais (2007) passou-se para 46 (2010).
A violência contra a mulher, que muitas vezes culmina em feminicídio, também se espalha e atinge desde adolescentes a mulheres. Em denúncias registradas nos anos de 2009 e 2010 a violência, especificamente intrafamiliar, atingiu mulheres de 13 a 60 anos de idade.
Das 1.436 denúncias recebidas nestes mesmos anos, os empurrões (28%) e socos (22%) representaram uma grande parte, mas é a violência psicológica, os insultos e a falta de afeto, os problemas mais denunciados pelas salvadorenhas. A violência sexual, o uso de palavras obscenas, a intimidação (revista de objetos e partes íntimas) e a prática de relações sexuais a força também foram denunciada pelas mulheres. Apenas em 2009 e 2010 foram somados 597 casos no país.
Infelizmente, o problema de El Salvador vai além das altas cifras de violência e feminicídio. O que assusta são as características destes tipos de crimes, pois os cadáveres das vítimas muitas vezes aparecem com os pés e mãos queimados, outras vezes cortados; objetos como paus, arames, garrafas e facas também são encontrados inseridos dentro do órgão sexual das mulheres. As autópsias mostram ainda que muitas vítimas sofreram agressões sexuais e tortura antes de morrer.
Para Ima Guirola, representante da organização feminista Cemujer, os assassinatos violentos e as demais selvagerias cometidas contra as mulheres respondem a "uma construção cultural geral de aprovação da violência” em El Salvador. Guirola acrescentou que após o conflito armado (1980-1992) que vitimou 75 mil pessoas, a população "tem visto a violência com especial naturalidade e tolerância”.
Além desta banalização da violência, a impunidade tem sido a principal aliada. De acordo com Julia Evelyn Martínez, diretora do Isdemu, em até 70% dos casos de feminicídio em El Salvador não há sentença condenatória nos tribunais.
Em virtude da grave situação no país, organismos internacionais foram acionados para cobrar do Estado de El Salvador que cuide de suas mulheres e olhe para esta questão como de grande importância para o desenvolvimento integral do país.
De acordo com o Relatório Nacional sobre a situação de violência contra as mulheres, entre as obrigações de El Salvador, muitas delas pendentes, o Estado deve "assegurar a aplicação de medidas de proteção urgentes e eficazes destinadas a prevenir e combater a violência contra as mulheres e meninas”; "aumentar os esforços para combater a discriminação e a violência contra a mulher e a impunidade por esses delitos”; e "acelerar a reforma legislativa em marcha para combater a insegurança e a violência dirigida a mulheres e meninas e consolidar essas medidas”.


Fonte:( www.adital.com.br)

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Violência contra a mulher e políticas públicas

Eva Alterman Blay

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RESUMO

DIFERENTEMENTE dos inúmeros estudos existentes, de excelente qualidade, esta pesquisa busca investigar não apenas a chamada violência doméstica mas os vários tipos de homicídio – tentativa ou consumação – de mulheres, de todas as faixas etárias. Ela investigou e procurou comparar como este crime era tratado: 1. pela mídia (especialmente jornais de 1991 e de 2000); pelo rádio e televisão; 2. nos Boletins de Ocorrência das Delegacias de Policia da capital de São Paulo (do ano de 1998); 3. nos Processos Judiciais, através de uma amostra representativa dos cinco Tribunais do Júri da Capital de São Paulo (de 1997). Desejava saber como a mídia tão resistente a principio se comportava na passagem do século XXI face à violência contra a mulher, o que os BOs registravam e como eram julgados os assassinos/as de mulheres. Os complexos resultados obtidos revelaram mudanças em alguns segmentos e um concomitante mecanismo que retroalimenta a antiga violência nas relações sociais de gênero. Concluindo propõe-se a implantação de uma política transversal de gênero para enfrentar a violência

Violência de gênero: um problema mundial e antigo


AGREDIR, matar, estuprar uma mulher ou uma menina são fatos que têm acontecido ao longo da história em praticamente todos os países ditos civilizados e dotados dos mais diferentes regimes econômicos e políticos. A magnitude da agressão, porém, varia. É mais freqüente em países de uma prevalecente cultura masculina, e menor em culturas que buscam soluções igualitárias para as diferenças de gênero. Organismos internacionais começaram a se mobilizar contra este tipo de violência depois de 1975, quando a ONU realizou o primeiro Dia Internacional da Mulher. Mesmo assim, a Comissão de Direitos Humanos da própria ONU, apenas há dez anos, na Reunião de Viena de 1993, incluiu um capítulo de denuncia e propõe medidas para coibir a violência de gênero.
No Brasil, sob o pretexto do adultério, o assassinato de mulheres era legítimo antes da República. Koerner mostra que a relação sexual da mulher, fora do casamento, constituía adultério – o que pelo livro V das Ordenações Filipinas permitia que o marido matasse a ambos. O Código Criminal de 1830 atenuava o homicídio praticado pelo marido quando houvesse adultério. Observe-se que, se o marido mantivesse relação constante com outra mulher, esta situação constituía concubinato e não adultério. Posteriormente, o Código Civil (1916) alterou estas disposições considerando o adultério de ambos os cônjuges razão para desquite.
Entretanto, alterar a lei não modificou o costume de matar a esposa ou companheira.

O movimento feminista do fim do século XIX e começo do século XX

Desde a metade do século XIX até depois da Primeira Guerra Mundial, o panorama econômico e cultural do Brasil mudou profundamente. A industrialização e a urbanização alteraram a vida cotidiana, particularmente das mulheres, que passaram a, cada vez mais, ocupar o espaço das ruas, a trabalhar fora de casa, a estudar etc. Vale a pena ler a análise de Susan Besse (1999) para se compreender o quanto essa transformação da infra-estrutura econômica, mais a alfabetização das mulheres, o cinema, os meios de transporte, a substituição de bens produzidos em casa pelos oferecidos pelas casas comerciais, alterou inteiramente o ritmo de vida e os contatos que as mulheres e homens passaram a desfrutar. Essas mudanças trouxeram o contato com comportamentos e valores de outros países, os quais passaram a ser confrontados com os costumes patriarcais ainda vigentes embora enfraquecidos.

Dentre estas mudanças destacou-se a discussão sobre o casamento. Mulheres das classes média e alta, graças à educação e ao trabalho remunerado, adquiriram maior "poder social e econômico" (Besse, 1999, p. 41) e passaram a protestar contra a "tirania dos homens" no casamento, sua infidelidade, brutalidade, abandono – temas freqüentes entre escritoras, jornalistas e feministas dos anos de 1920 (Besse cita, entre elas, Cecilia Bandeira de Melo Rebêlo de Vasconcelos, que escrevia sob o pseudônimo de Chrisanthème, Elizabeth Bastos, Iracema, Amélia de Resende Martins, Andradina de Oliveira etc.) além das inúmeras leitoras da Revista Feminina. Já então se apontava que maridos tinham sido assassinados por mulheres brutalizadas (Besse, 1999, p. 46). A interpretação dessas queixas era traduzida como "crise" na família e o no casamento (Besse, 1999, p. 41) cujos responsáveis seriam o trabalho feminino e a paixão.
Naquela época, como hoje, afirmava-se que o trabalho feminino fora de casa provocava a desagregação da família. Daí o Estado ter incluído no Código Civil (1916), para proteger a família (mesmo a pobre), que a mulher deveria ter autorização do marido para poder trabalhar.
Quanto ao casamento, reagia-se afirmando que era necessário retirar dele a romântica união por amor, substituindo-a pelo amor "civilizado", dotado de razão, excluindo a paixão, responsável pelos "crimes passionais sanguinários" (Peixoto apud Besse, 1999, p. 69).
Os crimes passionais, um dos mais graves problemas da época, constituíam uma verdadeira "epidemia" para algumas feministas. Encabeçando o movimento contra estes crimes, Promotores Públicos como Roberto Lyra, Carlos Sussekind de Mendonça, Caetano Pinto de Miranda Montenegro e Lourenço de Mattos Borges fundaram o Conselho Brasileiro de Hygiene Social. Pretendiam coibir e punir os crimes passionais então tolerados pela sociedade e pela Justiça. Não era propriamente a defesa das mulheres que eles visavam, mas pretendiam, efetivamente, proteger a instituição família (Besse, 1999, p. 90).
A atuação das mulheres nas décadas de 1920 e 1930, mais a ação dos Promotores Públicos e do Juiz Nelson Hungria, apontam o gravíssimo problema do assassinato de esposas e companheiras, até hoje não resolvido, se é que não foi incrementado.
O movimento dos Promotores e das feministas alcançou êxito relativo, embora o assassinato por amor continuasse a ocorrer e os assassinos a serem absolvidos.

"Quem ama não mata"

Um forte movimento pela defesa da vida das mulheres e pela punição dos assassinos voltou a ocorrer na década de 1970, tendo seu auge após 30 de dezembro de 1976, quando Angela Diniz foi morta por Doca Street, de quem ela desejava se separar.
A morte de Angela e a libertação de seu assassino levantaram um forte clamor das mulheres que se organizaram em torno do lema: "quem ama não mata". Pela segunda vez na história brasileira, repudiava-se publicamente que o amor justificasse o crime.
Acostumado à subserviência conservadora, Lins e Silva, defensor de Doca, revelou seu espanto ante a extraordinária pressão popular que acompanhou o julgamento. O caso teve enorme repercussão não só no Brasil, mas também no exterior, havendo "publicidade nunca vista" sobre este caso, reclamou Lins e Silva (1991, p. 295). Grande controvérsia ocupou a imprensa (Blay, 2003) acirrando-se a polêmica contra os direitos humanos das mulheres. Os jornalistas Paulo Francis e Tristão de Ataíde mostraram-se indignados contra as feministas e suas manifestações públicas que, segundo eles, pré-condenaram o réu; Lins e Silva (1991, p. 295) irritou-se com a repercussão que transformou uma "briga entre amantes em acontecimento nacional". Referiu-se ao "incidente" como se a vítima estivesse viva. Os prestigiados jornalistas e o advogado consideraram ilegítima a pressão da opinião pública nestes crimes contra mulheres justificados pelo amor.
Dentre as matérias publicadas na época, artigo de Carlos Heitor Cony na revista Fatos e Fotos – Gente, assim descrevia o crime:
eu vi o corpo da moça estendido no mármore da delegacia de Cabo Frio. Parecia ao mesmo tempo uma criança e boneca enorme quebrada... Mas desde o momento em que vi o seu cadáver tive imensa pena, não dela, boneca quebrada, mas de seu assassino, que aquele instante eu não sabia quem era (grifo meu).
O jornalista titubeia em sua opinião sobre o crime. De um lado, cita a Promotoria que acusava Street de libertinagem, cafetinagem, e conclui: "Mas outros cafetões, outros libertinos e safados não se tornaram assassinos". Por outro lado, em benefício do assassino, Cony entrevista o delegado Sérgio Paranhos Fleury, que afirma "[...] o único crime respeitável, que não condenaria com rigor, era o passional... Crime passional qualquer um comete, até eu". Cony conclui: "A chamada privação de sentidos provocada pela paixão pode fazer do mais cordial dos homens um assassino".


Ensinando a defender os que matavam "por amor"


Dentro do princípio inquestionável de que todos têm direito a defesa, a culpa deve ser provada, ensina a academia como mecanismo da argumentação. O modelo paradigmático da didática de defesa dos assassinos "por amor" encontra-se no livro de Evandro Lins e Silva A defesa tem a palavra (1991). Nele, o jurista ensina os jovens advogados a defender um assassino, mesmo que confesso, e toma como modelo a defesa que ele próprio fizera de Doca Street, o assassino de Angela Diniz.
Doca Street matou Angela Diniz e confessou o crime alguns dias depois. Convivera com ela apenas três meses. Argumentava a Promotoria (auxiliada pelo advogado Evaristo de Morais, contratado pela família de Angela), que ela não suportava mais sustentar um companheiro ciumento, agressivo e violento. Depois dos poucos meses de conturbada convivência, durante os quais houve várias tentativas de rompimento, Angela mais uma vez mandou Doca sair de sua casa em Cabo Frio (Estado do Rio de Janeiro). Este fingiu se retirar da residência, arrumou as malas, colocou-as em seu automóvel mas, minutos depois retornou munido de uma Bereta. Perseguiu-a no banheiro e a matou com vários tiros, especialmente no rosto e no crânio.
A Promotoria descreve Doca como pessoa que não trabalhava, sem endereço fixo, e que tivera várias mulheres, filhos dentro e fora do casamento, problemas criminais na juventude, homem violento e possessivo.
Como se contrapor ao perfil descrito pela Promotoria? Como demonstrar que Doca era pessoa absolutamente idônea, trabalhadora, bom pai, bom marido e com residência fixa?
O hábil defensor ensina, passo a passo, a construção desta imagem. São duas as principais estratégias. Primeiro era necessário demonstrar o bom caráter do assassino. Segundo, era importante denegrir a vítima, mostrar como ela o levara ao ato criminoso.
Doca, que não tinha profissão conhecida, passou a ser descrito como pessoa que vivia de comissões obtidas pela venda de letras de câmbio ou títulos para Bancos de Investimento. Bastaram uns três depósitos bancários para atestar esta fonte de renda. Quanto a ter se relacionado com várias mulheres, isto não é negado, porém, afirma-se que ele só amara uma: Angela Diniz.
Mas restava ainda uma pergunta: como foi possível que pessoa tão correta matasse uma mulher que conhecera há apenas três meses e pela qual nutria paixão tão fulminante? Como defender este impulso criminoso perante o Tribunal do Júri? Ensina Evandro Lins e Silva (1991, p. 27): "no Tribunal do Júri, o que se julga é o homem, muito mais do que o crime". Cabe ao defensor, portanto, munir-se de todas as informações possíveis para defender seu cliente. O bom advogado deve penetrar nos sentimentos que o levaram a cometer o crime, e, para captar estas emoções, deve servir-se da literatura. Evandro conta ter se preparado lendo A servidão humana, onde reviu as "penas de Philip, sofrendo pelo amor da insensível Mildred". Para entender a rejeição sentida pelos amantes,
medi a extensão do martírio dos apaixonados repelidos pela mulher amada. Reli a defesa de Ferri, bela, magistral, do jovem chileno Carlo Cienfuegos, que matou em Roma a amante, Bianca Hamilton, mulher fatal e sedutora, que o levou ao desvario, ao crime e à tentativa de suicídio... (Lins e Silva, 1991, p. 24).
Enfim, municiou-se para apresentar os sentimentos de rejeição, paixão, desvario, tudo o que pudesse comover o júri e levá-lo a inocentar o assassino da "mulher amada", cujo maior pecado era não aceitar tal amor.
Nas escolas de Direito, ensina-se o mecanismo da preparação da defesa. Mas será que é dada a mesma ênfase aos direitos humanos das mulheres, dos pobres, dos e das negras e demais minorias?

As organizações não governamentais (ONGs) feministas

Ao longo das décadas de 1960 e 1970, feministas de classe média, militantes políticas contra a ditadura militar e intelectuais foram se somando a sindicalistas e trabalhadoras de diferentes setores. Certamente, unia-as uma visão democrática e igualitária dos direitos da mulher que suplantava diferenças partidárias e ideológicas. Formou-se um vasto movimento unido de mulheres, se considerarmos que o inimigo era comum. (É claro que, em contrapartida, o movimento feminino conservador, ligado especialmente à igreja católica e ao movimento militar, também se organizou). Ao movimento feminista se aglutinou uma série de grupos que atuaram cotidianamente a favor dos direitos a melhores condições de vida, pela anistia, pela igualdade de direitos entre homens e mulheres. A formação de entidades voltadas a abrigar mulheres vítimas de violência doméstica não tardou a se formar. Por todo o Brasil grupos de ativistas, voluntárias, procuravam enfrentar todos os tipos de violência: estupros, maus tratos, incestos, perseguição a prostitutas, e infindáveis violações dos direitos humanos de mulheres e meninas. Diferentemente das décadas de 1910 e 1920, agora as denúncias destes crimes escondidos na e pela família tornaram-se públicos. Recebidos inicialmente com descrédito e sarcasmo pela mídia em geral, aos poucos foram reconhecidos (ver mais adiante essa transformação na imprensa escrita).

Muito esforço custou às mulheres da sociedade civil arcar com esta fundamental atividade.

Os Conselhos da Condição Feminina e as Delegacias de Defesa da Mulher

Com a anistia de 1979, a eleição direta de governadores em 1982 e a reorganização partidária, o cenário feminista se fortaleceu mas se segmentou em grupos partidários.
Para fazer frente às demandas de igualdade de gênero foi criado, em 1983, o primeiro Conselho Estadual da Condição Feminina em São Paulo. Em 1985, criou-se a primeira Delegacia de Defesa da Mulher, órgão eminentemente voltado para reprimir a violência contra a mulher (Massuno, 2002).
Concomitantemente, na sociedade civil, como já apontamos, vigoravam vários grupos feministas de apoio às mulheres vítimas. Intenso trabalho, quase sempre com escassos recursos e muito voluntariado, tentava suprir uma lacuna que agora, timidamente, começava a ser encampada pelo Estado.
Nos anos anteriores, as mulheres que recorriam às Delegacias em geral sentiam-se ameaçadas ou eram vítimas de incompreensão, machismo e até mesmo de violência sexual. Com a criação das Delegacias de Defesa da Mulher (DDM) o quadro começou a ser alterado. O serviço nas DDMs era e é prestado por mulheres, mas isto não bastava, pois muitas destas profissionais tinham sido socializadas numa cultura machista e agiam de acordo com tais padrões. Foi necessário muito treinamento e conscientização para formar profissionais, mulheres e homens, que entendessem que meninas e mulheres tinham o direito de não aceitar a violência cometida por pais, padrastos, maridos, companheiros e outros. Esta tarefa de reciclagem deve ser permanente, pois os quadros funcionais mudam e também os problemas.
Alterar essa relação de subordinação de gênero foi o início de uma revolução parcialmente bem-sucedida nos papéis sociais. Os crimes de gênero continuaram.
Cada vez mais estudos verificaram que não eram apenas maridos, mas outros parceiros também agrediam e matavam as mulheres sob os mais diversos pretextos.
Direitos humanos e homicídio de mulheres
Em 1995, dei inicio à pesquisa sobre homicídio de mulheres para verificar como este crime era tratado: 1. pela mídia (especialmente jornais de 1991 e de 2000); 2. nos Boletins de Ocorrência das Delegacias de Polícia da capital de São Paulo (do ano de 1998); 3. nos Processos Judiciais, por meio de uma amostra representativa dos cinco Tribunais do Júri da Capital de São Paulo (de 1997). Desejava saber como a mídia, tão resistente a princípio, comportava-se na passagem do século XXI, o que os BOs registravam e como eram julgados os assassinos(as) de mulheres.
Diferentemente dos inúmeros estudos existentes, de excelente qualidade, esta pesquisa buscava investigar não apenas a chamada violência doméstica, mas os vários tipos de homicídio – tentativa ou consumação – de mulheres de todas as faixas etárias.

Entre os resultados alcançados verificou-se:

Pelas notícias de jornais

• Matam-se pessoas do sexo feminino de todas as idades, desde bebês até mulheres com mais de setenta anos. Prevalece a faixa compreendida entre 22 e trinta anos.
• Os jornais de 1991 indicavam que 22% dos crimes eram motivados por tentativas de separação, ciúme, ou suspeita de adultério. Em 2000, estes mesmos motivos cresceram e foram responsáveis por 28% dos crimes.
• O filicídio, cometido por pais ou mães, não é raro no Brasil e nem em São Paulo. Em 1991, 8% das meninas assassinadas tinham menos de dez anos; a percentagem é quase igual em 2000: 7%. Pais e mães nem sempre matam pelas mesmas razões. No caso das mães, o filicídio é atribuído, em geral, a dificuldades econômicas, abandono pelo pai da criança, a chamada e pouco conhecida depressão pós-parto, ou por vingança ao companheiro. No caso dos homens, o filicídio aparece, quase sempre, associado à vingança contra a mulher: um homem abandonado não se contenta em se vingar da companheira, ele mata também os(as) filhos(as) e eventualmente outras pessoas que tentam detê-lo.
• A "violência urbana" (balas perdidas, assaltos e sobretudo crimes em áreas de lazer) que, em 1991, era responsável por 17% dos crimes noticiados, reduziu-se relativamente, sendo substituída pelo aumento das ocorrências ligadas à droga (18% em 2000).
• O conteúdo do noticiário mostra uma clara tendência de mudança de linguagem. Se até a década de 1980 as vítimas eram apresentadas como causadoras de sua própria morte e havia um visível apoio aos assassinos – que seriam "levados" ao crime pela suposta conduta infiel da mulher ou por ela querer romper um relacionamento, na última década do século XX o noticiário se tornou mais investigativo, relativamente neutro e com certa tendência a questionar julgamentos que facilitavam a fuga dos réus.
• Destaco ainda que o espaço destinado a estas notícias, o local da publicação no jornal assim como aspectos da linguagem, refletem a classe social da vítima e do agressor.

Rádio e televisão

• Contraditoriamente, o rádio e a televisão continuam a reproduzir em seus programas musicais os antigos sucessos em que o homem mata a mulher que não mais quer a "felicidade" que ele lhe proporcionava. Veja-se como exemplo a antiga e sempre tocada canção Cabocla Teresa (Raul Torres e João Pacífico) cujos versos cantam, sem remorso, o assassinato de Teresa:

Vancê, Tereza, descansa/ Jurei de fazer vingança/ Pra mordi de nosso amor
Há tempos eu fiz um ranchinho/ Pra minha cabocla morar
Pois era ali nosso ninho/ Bem longe desse lugar/ No alto lá da montanha
Perto da luz do luar/ Vivi um ano feliz/ Sem nunca isso esperar
E muito tempo passou/ Pensando em ser tão feliz/ Mas a Tereza, dotô
Felicidade não quis/ Pus meus sonhos nesse olhar/ Paguei caro meu amor
Por mordi de outro caboclo/ Meu rancho ela abandonou/ Senti meu sangue ferver
Jurei a Tereza matar/ O meu alazão arriei/ E ela fui procurar/ Agora já me vinguei
É esse o fim de um amor/ Essa cabocla eu matei/ É a minha história dotô
Os programas televisivos, que dramatizam os crimes passionais, estupros seguidos de morte, incesto, trazem uma dupla mensagem: de um lado acusam o criminoso mas, ao mesmo tempo, romantizam esse tipo de crime. Esses veículos tendem a reproduzir a antiga versão de que a "vítima é responsável por sua morte" e, muitas vezes, ao reiterarem imagens e reconstituições dos supostos fatos exaltam os crimes.
Assim, o noticiário mostra um processo contraditório de mudança: ao mesmo tempo em que não mais se aceita o "matei por amor" noticia-se um incremento nos crimes que tem tais justificativas.

Boletins de ocorrência (BOs)

Pesquisamos os Boletins de Ocorrência (BOs) nas Delegacias Gerais e não nas Delegacias de Defesa da Mulher pois estas, em razão da competência legal, estavam impedidas de registrar homicídios de mulheres até 1996. A Secretaria de Segurança recebe uma cópia de todos os BOs, mas, ao divulgar suas análises estatísticas, não informa o sexo da vítima, uma grande dificuldade para o conhecimento dos fatos que bem indica a desimportância das relações de gênero e a predominância de uma visão apenas masculina. Foi um longo e penoso trabalho separar, manualmente, dentre os milhares de BOs de 1998, aqueles em que havia vítimas femininas.
• Resultou o levantamento de 623 ocorrências com 964 vítimas, das quais 669 mulheres e 294 homens (em um BO o sexo não estava identificado). Entre as 669 vítimas mulheres, 285 eram vítimas de homicídio e 384 de tentativa de homicídio (ver notas).
• A análise dos BOs mostrou que, na metade das ocorrências, o(a) agressor(a) é desconhecido. Entre os identificados, quando a vítima é mulher, 90% dos autores são homens.
• A maioria das vítimas – 62% – são mulheres brancas, 7% são negras e 30% pardas.
• Constatamos que a maioria tem alfabetização de nível primário (74%), embora 14% tenham o secundário e 3% o universitário.
• Confirmando os dados da imprensa, as vítimas estão na faixa etária dos 22 aos trinta anos.
• O perfil socioeconômico e etário dos agressores assemelha-se ao das vítimas.
• Apesar das inúmeras lacunas que os BOs apresentam, observou-se que cinco em cada dez homicídios são cometidos pelo esposo, namorado, noivo, companheiro, "amante" (sic). Se incluirmos ex-parceiros, este número cresce: em sete de cada dez casos as mulheres são vítimas de homens com os quais tiveram algum tipo de relacionamento afetivo. É marcante a dificuldade com que homens aceitem que a mulher rompa um relacionamento (cerca de dois em cada dez crimes são cometidos por ex-parceiros).
• Embora perdure a ideologia de que o lar é um lugar seguro, as relações familiares não são pacíficas: 12% dos homicídios ou tentativas são de responsabilidade do pai, mãe, filho, padrasto, sogra, ou seja, entre os agressores conhecidos, 66% são parentes da vítima feminina.
• Qualquer instrumento serve para agredir – facas, ácido, fogo, madeira, ferro, além das próprias mãos – mas em sete de cada dez casos o revólver é usado.
Processos Criminais nos Tribunais do Júri

Os BOs, nos casos de homicídio e tentativa de homicídio, e depois Inquéritos Policiais – fase de instrução policial – quando encerrados são remetidos ao Poder Judiciário, onde nova fase de instrução será aberta para final julgamento. Para facilidade de compreensão, denomino Processo Criminal (PC) essa fase que se abre na Justiça. A localização dos processos demandou cerca de dois anos de pesquisa, a partir do exame dos livros de registro dos Fóruns Criminais da Capital, e mais um ano e meio para localização e exame dos mesmos nos Tribunais do Júri da Barra Funda, Jabaquara, Santo Amaro, Pinheiros e Penha. De um total de 8.805 processos, após procedimentos de seleção de uma amostra representativa, deveríamos analisar cem casos. Prevendo problemas, que de fato ocorreram, resultou uma amostra representativa de 81 Processos Judiciais.
• Consistentemente com os achados anteriores, observamos que as vítimas são mulheres jovens, de 22 a trinta anos predominantemente, de cor branca, cuja escolaridade é 1º grau incompleto, com profissão "não qualificada" originárias do Estado de São Paulo.
• Viviam em casas precárias de alvenaria ou apartamentos tipo conjunto habitacional, predominantemente na Zona Leste.
• São solteiras, na maioria, têm filhos, sendo que uma em cada quatro tiveram filhos com os companheiros com quem viviam quando foram vitimadas.
• Apenas 9% destas vítimas tinham antecedentes criminais.
• Cerca de 2% estavam grávidas quando foram assassinadas ou sofreram tentativa, fato que não impediu ou até motivou o crime.
• Agressores, mais do que vítimas, têm nível educacional de 1º grau incompleto (33% e 28%) e estão na mesma faixa etária delas.
• Cerca de 5% das vítimas têm nível universitário (completo ou não) o qual não aparece entre os réus, o que não deve ser interpretado literalmente mas merece cuidadosa análise. Não estariam os criminosos de nível universitário entre os que fugiram?
• As informações contidas nos processos são muito incompletas: em 30% dos casos não se tem informação sobre o nível educacional das vítimas, suas profissões, condição de moradia, antecedentes criminais e até mesmo se elas estavam grávidas ou não. Também não há informação se tinham filhos.
• Constatou-se que a maioria das vítimas (28%) tinha profissão "não qualificada" seguidas pelas "do lar" (23%). Cerca de 8% eram estudantes de vários níveis. Entre os réus, havia igual porcentagem de qualificados e não-qualificados (20%), 10% eram comerciantes. Praticamente não havia desempregados declarados.
• Os réus têm uma posição socioeconômica um pouco mais elevada do que as mulheres. De modo geral, trata-se de uma população de baixa ou média renda.• Observa-se que em 50% dos casos o criminoso é desconhecido, o que, associado às informações da imprensa e aos Bos, permite sugerir que são homens de condição socioeconômica que lhes permite contratar advogados, fugir do flagrante e eventualmente nunca serem encontrados.
• Embora haja inúmeras contradições entre as informações dos BOs e dos processos, observou-se consistência quanto à cor: em 50% dos casos a vítima era branca. No caso dos réus, a percentagem é um pouco menor (29%) embora ainda predominem os brancos. Cerca de 36% das vítimas eram pardas e 1% negras. Entre os réus, 21% eram pardos e 8% negros. Num país de racismo oculto como o Brasil, em que se atribui quase sempre a responsabilidade da violência aos negros, estes dados vêm desmentir aquele preconceito.
• Quase a metade das vítimas era solteira. Uma em cada quatro era casada legalmente. Uma em cada dez vivia junto a um companheiro. Não importa o estado civil, portanto, todas tiveram um destino semelhante, foram vítimas de tentativa ou de homicídio.
• No caso dos réus, apenas um em cada quatro eram solteiros, 13% eram casados e outros 13% tinham uma companheira. Isso indica que os réus eram casados mas não com as suas vítimas.

Constatamos que, do total de processos enviados aos Tribunais e que não foram a Júri ou estão sem julgamento definitivo: 50% foram arquivados (basicamente porque os criminosos não foram identificados); 24% estão suspensos (porque o réu está foragido), em dois casos foram impronunciados (pois as provas eram insuficientes) e em três foram absolvidos.
Apenas 14% dos réus foram julgados e condenados.
Em média, os processos não ficam muito tempo nos Tribunais: 46% ficam de um a dois anos. Mas o andamento, o excesso de vezes que as testemunhas devem ser ouvidas, as possibilidades de idas e voltas certamente facilita a fuga dos réus e a perda de contato com as testemunhas.
O problema, então, não está na suposta morosidade da justiça, mas nos trâmites legais que deveriam ser mais ágeis e limitados. Em nome da ampla defesa dos réus certos setores dos aplicadores do Direito subestimam a extensão e gravidade da violência praticada contra a mulher. É urgentíssima uma revisão do procedimento jurídico se quisermos, de fato, alterar a impunidade que cerca estes crimes, como expressaram vários juizes, promotores e advogados entrevistados.
Conclusão
Homicídios de mulheres fazem parte da realidade e do imaginário brasileiro há séculos, como mostra variada literatura de caráter jurídico, histórico, sociológico, revistas, notícias de jornal, além da dramaturgia, literatura de cordel, novelas de rádio e televisão, música popular, e a presente pesquisa. Depois de trinta anos de feminismo, que impôs à sociedade o "quem ama não mata" como repulsa ao assassinato justificado pelo "matar por amor" e de consistentes mudanças na posição socioeconômica e nos valores relativos à relação homem x mulher, como explicar que crimes de gênero continuem a ocorrer?
Reunindo-se os vários dados analisados, depreende-se que essa contradição perdura por várias razões, tais como: a persistente cultura de subordinação da mulher ao homem de quem ela é considerada uma inalienável e eterna propriedade; uma recorrente dramatização romântica do amor passional, sobretudo na televisão e no rádio, em que realidade e imaginário se retro-alimentam; na facilidade com que os procedimentos judiciais permitem a fuga dos réus; na pouca importância que as instituições do Estado dão à denúncia e ao julgamento dos crimes contra as mulheres e meninas.
Para enfrentar esta cultura machista e patriarcal são necessárias políticas públicas transversais que atuem modificando a discriminação e a incompreensão de que os Direitos das Mulheres são Direitos Humanos. Modificar a cultura da subordinação de gênero requer uma ação conjugada.
Para isso é fundamental estabelecer uma articulação entre os programas dos Ministérios da Justiça, da Educação, da Saúde, do Planejamento e demais ministérios.
Exemplo dessa desarticulação está na proposta de criação de mais Delegacias de Defesa da Mulher, instrumento muito importante mas que tem de ser aparelhado em sua estrutura física, equipamento e ligação com as demais delegacias, com a Secretaria de Segurança, da Justiça, da Educação e demais órgãos do governo estadual e federal. Assim como o pessoal desta importante instituição precisa ser treinado permanentemente, as Delegacias pouco podem fazer se não estiverem inseridas em um programa de transformação da cultura da força e da violência de gênero.

Nos programas escolares – desde o ensino fundamental até o universitário – precisa haver a inclusão da dimensão gênero mostrando como a hierarquia existente na cultura brasileira de subordinação da mulher ao homem traz desequilíbrios de todas as ordens – econômico, familiar, emocional e incrementa a violência. Mas a escola não pode ficar isolada de um processo amplo de transformação para alcançar a equidade de gênero. O que pode fazer uma professora, de qualquer nível da escala educacional, se ela própria é violentada? O que pode ensinar um professor que é um violador? O que pode fazer a escola se estiver desligada de um processo de transformação cultural?
Políticas públicas transversais visando ao mesmo objetivo – a equidade entre homens e mulheres – constitui um caminho para alterar a violência em geral e de gênero em particular. A Secretaria dos Direitos da Mulher pode desempenhar este papel articulador, associando-se aos Conselhos ou Secretarias da Mulher em todos os Estados.
Destaque-se, sobretudo, que um planejamento de políticas públicas transversais só funcionará com a total participação da sociedade civil.

Nota
A pesquisa teve de incorporar a complexidade dos BOs, pois eles podem conter mais de uma vítima, referir-se a uma chacina com diversas vítimas, conter vítimas dos dois sexos, de várias idades. Podem, também, incluir mulheres agressoras.



Eva Alterman Blay é professora titular de Sociologia na USP e coordenadora científica do Nemge (Núcleo de Estudos da Mulher e Relações Sociais de Gênero).


(fonte:www.scielo.br)

VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

Renato Ribeiro Velloso





Na esfera jurídica, violência significa uma espécie de coação, ou forma de constrangimento, posto em prática para vencer a capacidade de resistência de outrem, ou a levar a executá-lo, mesmo contra a sua vontade. É igualmente, ato de força exercido contra as coisas, na intenção de violentá-las, devassá-las, ou delas se apossar.

Existem vários tipos de armas utilizadas na violência contra a mulher, como: a lesão corporal, que é a agressão física, como socos, pontapés, bofetões, entre outros; o estupro ou violência carnal, sendo todo atentado contra o pudor de pessoa de outro sexo, por meio de força física, ou grave ameaça, com a intenção de satisfazer nela desejos lascivos, ou atos de luxúria; ameaça de morte ou qualquer outro mal, feitas por gestos, palavras ou por escrito; abandono material, quando o homem, não reconhece a paternidade, obrigando assim a mulher, entrar com uma ação de investigação de paternidade, para poder receber pensão alimentícia.

Mas nem todos deixam marcas físicas, como as ofensas verbais e morais, que causam dores,que superam, a dor física. Humilhações, torturas, abandono, etc, são considerados pequenos assassinatos diários, difíceis de superar e praticamente impossíveis de prevenir, fazendo com que as mulheres percam a referencia de cidadania.
A violência contra a mulher, não esta restrita a um certo meio, não escolhendo raça, idade ou condição social. A grande diferença é que entre as pessoas de maior poder financeiro, as mulheres, acabam se calando contra a violência recebida por elas, talvez por medo, vergonha ou até mesmo por dependência financeira.

Atualmente existe a Delegacia de Defesa da Mulher, que recebe todas as queixas de violência contra as mulheres, investigando e punindo os agressores. Como em toda a Polícia Civil, o registro das ocorrências, ou seja, a queixa é feita através de um Boletim de Ocorrência, que é um documento essencialmente informativo, todas as informações sobre o ocorrido visam instruir a autoridade policial, qual a tipicidade penal e como proceder nas investigações.

Toda a mulher violentada física ou moralmente, deve ter a coragem para denunciar o agressor, pois agindo assim ela esta se protegendo contra futuras agressões, e serve como exemplo para outras mulheres, pois enquanto houver a ocultação do crime sofrido, não vamos encontrar soluções para o problema.

A população deve exigir do Governo leis severas e firmes, não adianta se iludir achando que esse é um problema sem solução. Uma vez violentada, talvez ela nunca mais volte a ser a mesma de outrora, sua vida estará margeada de medo e vergonha, sem amor próprio, deixando de ser um membro da comunidade, para viver no seu próprio mundo.

A liberdade e a justiça, são um bem que necessita de condições essenciais para que floresça, ninguém vive sozinho. A felicidade de uma pessoa esta em amar e ser amada. Devemos cultivar a vida, denunciando todos os tipos de agressões (violência) sofridas.


* RENATO RIBEIRO VELLOSO (renatov@matrix.com.br), Membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCrim, Pós-Graduando em Direito Penal Econômico Internacional, pelo Instituto de Direito Penal Econômico e Europeu da Universidade de Coimbra, Portugal


(fonte:www.portaldafamilia.org )

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Que engrenagem social está por trás dos feminicídios de adolescentes?

Maria Dolores de Brito Mota
Socióloga, Profª da UFC, Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero, Idade e Família, NEGIF
Adital

Feminicidio Juvenil - machismo, sociopatia, impunidade


No ano de 2010 foram registrados 153 feminicídios no Ceará, entres esses 16 foram de adolescentes de 13 a 17 anos. Do final de 2010 até maio de 2011, alguns casos envolvendo o assassinato de garotas chocaram o país. Alguns deles:

Novembro 2010, Salvador: Janaína Brito Conceição, de 16 anos, e Gabriela Alves Nunes, de 13, foram estupradas e mortas por três homens adultos.
· Março 2011, Cunha SP: as irmãs Josely Oliveira e Juliana Oliveira, de 16 e 17 anos foram assassinadas a tiros em Cunha por um homem adulto conhecido da família que tinha interesse por uma delas, suspeita-se do envolvimento de sua namorada no crime.
· Abril 2011, Cassilândia, MS: Adrieli Camacho Almeida, de 16 anos, foi morta a facadas porum adolescente, também de 16 anos, irmão de sua namorada, um feminicídio homofóbico.
· Maio 2011, Santana da Parnaíba: Elaine Gomes da Cruz e Raizza Tavares, ambas de 13 anos, assassinadas por dois adolescentes de 15 anos cada, colegas de colégio, um deles namorado de Elaine.

O que está indicando esses feminicídios juvenis? Possivelmente a configuração de novas engrenagens de subordinação das mulheres como reação aos avanços e às desconstruções das modalidades tradicionais da dominação masculina. Novas modalidades de relações de dominação e de violência masculina, estruturadas num contexto de generalização de uma sensibilidade contrária à violência de gênero contra as mulheres e de avanço do reconhecimento dos direitos das mulheres, o que parece ser uma contradição. Chama a atenção a persistência de associação de homens, sejam amigos, sejam contratados, para a realização dos crimes. Não podemos deixar despercebido o fato dessas jovens estarem sendo assassinadas em duplas, de amigas, de irmãs, ou outras que surjam.

A formação dessas novas modalidades de dominação e violência de gênero é impulsionada por um contexto social minado por uma cultura de violência, de intolerância, de individualismo e também de impunidade. Somando a tudo isso uma nova configuração de infância e de adolescência marcada pela incorporação desses grupos no mundo adulto. Se a infância moderna foi construída como idílica, pura, ingênua, vivendo num mundo de fantasia, a infância pós - moderna está imersa no mundo do mercado, das mídias vivenciando as mesmas experiências que os adultos, mas sem amadurecimento biológico, emocional e afetivo para o discernimento e a escolha de valores e de experiências.

A morte violenta, a interrupção da vida da mulher, nesse contexto paradoxal, emerge como a possibilidade mais fácil e complacente de eliminar conflitos e antagonismos entre homens e mulheres? O surpreendente é esse padrão de comportamento e sentimento masculino estar presente em adolescentes e jovens, grupo social que até então apresentava mais abertura para mudanças e para a constituição de valores e atitudes igualitárias.

Observamos dois fenômenos. O aumento do número de meninas e adolescentes assassinadas em contextos engendrados, e o aumento de adolescentes feminicidas, assassinos de mulheres. Estão ocorrendo casos em que adolescentes são assassinadas em situações de envolvimento amoroso em meio a rupturas e conflitos com os parceiros, e também em situações de violência sexual, em que são vítimas de crime sexual.

A ativação precoce demais dos estímulos sexuais de adolescentes e crianças estimula a experimentar as experiências sexuais mais precoces (como fatos naturais que os fazem sentir-se ‘como os grandes’ = adultos), quando psicologicamente não estão preparados para enfrentar e resolver os desentendimentos, as maluquices e desorganizações das relações humanas. Combinando-se essa precocidade com uma cultura de violência disseminada na sociedade e apresentada na mídia de modo espetacularizado em que assassinos de crimes de todo tipo parecem celebridades (caso Bruno – Elisa e tantos outros). Essa combinação desencadeia a ‘novidade’ no adolescente: ele reage à moda espetacularizada, dando uma de macho (porque foi isso que ele aprendeu!) e mata. O assassino das amigas Elaine e Raizza estava sorrindo diante do assédio da imprensa ao ser preso!

Em alguns casos ocorridos em 2010, o feminicídio de jovens tinha relação com vingança e queima de arquivo pelo fato das vítimas saberem demais sobre crimes e trafico de drogas, mas o crime traz violência sexual, como estupro, nudez, mutilação e até carbonização do corpo, indicando intensa crueldade e ódio. Isso mostra o envolvimento de gente sempre mais nova com o mundo das drogas e do crime, que antes se constituía como universo masculino e cada vez mais tem envolvido mulheres, inclusivas as mais jovens.

O enfrentamento à violência de gênero contra a mulher no Brasil tem um percurso de quase 36 anos, se tomarmos como referência inicial a mobilização de grupos de mulheres, quando do assassinato de Ângela Diniz, em 30/12/1976, para denunciar a violência de homens contra mulheres em envolvimentos amorosos. Desse tempo até os dias atuais passou-se das denúncias para a reivindicação de políticas de atendimento às mulheres em situação de violência, bem como de combate a essa violência contra a mulher, até chegarmos a uma lei que se centra na garantia de direitos da mulher a uma vida sem violência – a Lei Maria da Penha.

As políticas públicas de combate à violência de gênero contra mulheres trançam um percurso da repressão/suspensão do crime, centrando-se no agressor –boletim de ocorrência, intimação, acordo ou penas de cestas básicas- para uma a criminalização dessa violência, aproximando-se de uma justiça reparativa que deve também oferecer às mulheres violentadas as condições para a garantia e restauração de seus direitos violados, além de punir o criminoso.

Mas, as engrenagens que estruturam na cultura a subordinação feminina e a violência contra as mulheres parecem dispor raízes mais profundas do que imaginávamos. É na formação da subjetividade dos sujeitos sociais que se pode compreender a sujeição e a dominação como elementos de constituição desses sujeitos. A persistência e a continuação de homens dominadores e violentos devem ser buscadas não apenas na história individual de cada sujeito, mas, sobretudo, no estado, na sociedade, cujos discursos e práticas interpelam o masculino como dominação e controle e o feminino como sujeição e dependência. Que fatores, valores alimentam esse tipo de interpelação de ser homem macho e controlador e ser mulher subordinada e dependente? Começar ações de prevenção, com disciplinas escolares sobre direitos humanos e relações de gênero, desde o maternal até o nível superior pode ser uma ação positiva de política pública, para firmar valores de reconhecimento, diversidade, direitos humanos e cidadania, pode ser o nosso próximo passo. Não é fazer uma aula, uma palestra ou oficina, mas criar um conteúdo de aprendizado para uma nova forma de ser homem e de ser mulher com base numa vivência de cidadania plena.

(fonte:www.adital.com.br)

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Irmã de jovem assassinada luta por justiça contra o crime de homofobia.

SÃO PAULO - Kezia Camacho, de 20 anos,

chora toda vez que se lembra da irmã,
Adriele Camacho de Oliveira, morta no mês
passado, aos 16 anos, numa emboscada que
teria sido preparada pelos irmãos e o pai da
então namorada da adolescente, em
Itarumã, Goiás. Há centenas de quilômetros
de Brasília, onde quarta-feira acontece a
Marcha Nacional contra a Homofobia, Kezia
luta em busca de justiça na cidade de
Cassilândia, no interior de Mato Grosso do
Sul, onde mora a família de Adriele.

Inconformada com os rumos da
investigação, ela tenta que a polícia faça
outra reconstituição do crime, sob
argumento de que há falhas da perícia.
Funcionária de uma loja de eletrodomésticos, casada, mãe de um menino de 2 anos, Kezia

pouco tem informação sobre o movimento que se alastra pelo país na luta pelas garantias dos
direitos dos homossexuais. Sabe "por alto" da decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a
união entre pessoas do mesmo sexo e não tem ideia de que Brasília será palco de protesto
contra crimes de intolerância.

Ela tenta colocar na cadeia o pai da namorada de Adriele, um fazendeiro que chegou a ser
preso na época, mas foi solto. Para ela, as informações do laudo pericial - hematomas e
perfurações a faca e estrangulamento - são suficientes para provar que Adriele não foi morta
por uma só pessoa, como tentam provar os advogados da família do fazendeiro.

'Minha irmã foi morta por puro preconceito'

Até agora só o filho do fazendeiro assumiu o crime. Ele espera julgamento preso na únicadelegacia de Itarumã, local do assassinato, onde os 5 mil habitantes permanecem em choque

desde o início de abril, quando ocorreu a morte. Há suspeita de que o rapaz tenha assumido a
responsabilidade para livrar de eventual prisão o pai, de 36 anos. O filho mais novo do
fazendeiro, de 13 anos, também teria envolvimento no crime.

Para a polícia, não há dúvidas de que o homicídio foi motivado por preconceito.

- A motivação é homofóbica, sem dúvida. O crime será tipificado como homicídio qualificado
por motivo torpe, a homofobia, e ocultação do cadáver - disse o delegado Samer Agi.

Kezia reforça:

- Minha irmã foi morta por puro preconceito. Nada mais explica o que fizeram com ela. Eles (a
família da ex-namorada) fizeram uma emboscada. Mesmo sob ameaças, não vou deixar de lutar

- diz Kezia, que já recebeu recados para "parar de mexer com o perigo".
A mãe das meninas, Ednalva Camacho, está em depressão.

- Está difícil para minha mãe porque quase sempre tem alguém que para ela no meio da rua e
pergunta sobre o crime. Ela, claro, não aguenta e começa a chorar. Foi uma crueldade o que
fizeram - diz Kelly, 18 anos, outra irmã de Adriele.

Ednalva diz que é difícil conceber a ideia de que alguém matou a filha por causa de um
preconceito que ela nunca teve.
- Era uma questão pessoal da minha filha, ninguém tinha nada a ver com isso - diz.
A mesma praça onde a mãe das meninas vende sorvete era o lugar onde Adriele e a namorada
passeavam de mãos dadas. Lésbicas assumidas, nunca tentaram esconder a opção sexual.
Moraram juntas três meses, mas a pressão da família da namorada tornou tudo insustentável.

Ao ligar para o celular da ex-namorada de Adriele, na última quinta-feira, O GLOBO foi
atendido por um homem que se identificou como parente dela. Ele perguntou o interesse da
reportagem, disse, em tom ríspido, que conversaria com os familiares e retornaria a ligação, o
que não aconteceu.
Em páginas de relacionamento na internet, a ex-namorada de Adriele diz que está namorando,
agora com um rapaz.

- Imagina o medo que uma menina de 16 anos tem de assumir sua sexualidade depois que a
namorada foi morta? Ninguém quer morrer por amor, né? - diz uma adolescente que conviveu
com o casal.

(Matéria do jornal: O Globo de 15/05/2011.)
(fonte: http://www.agenciapatriciagalvao.org.br/)

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Homens contra a violência machista

Artemisa


Artemisa Noticias
Adital
Por Alejandra Waigandt



Crescer o número de homens argentinos que combatem a violência de gênero. Em 2011, estão participando na campanha ‘260 homens contra o machismo’, impulsionada pelo governo nacional, que visibiliza os feminicídios que aconteceram em 2010. Ao aderir, os homens se comprometem a não exercer práticas machistas. Essa política soma-se à campanha ‘Laço Branco’ e a outros espaços onde os homens refletem sobre suas masculinidades e propõem ações concretas a favor da equidade de gênero.

Na Argentina, cada vez são mais os homens envolvidos na busca da igualdade de oportunidades, destacando sua participação na luta contra a violência de gênero. Para eles, introduzir-se nesses temas não é fácil porque começam a ser isolados por seus próprios pares nos espaços que frequetam. Também são duramente criticados devido a que questionam a situação de privilégio que a sociedade lhes destinou em detrimento da mulher. Nesse contexto, crescem atividades que, anos atrás, eram inconcebíveis. Por exemplo, a campanha nacional ‘260 homens contra o machismo’, lançado no dia 28 de março na cidade de Buenos Aires. A cifra representa o número de argentinas assassinadas violentamente por seus companheiros, ex-companheiros ou outros familiares em 2010, e surge do registro de casos realizado pelo Observatório da Sociedade Civil sobre Feminicídios na Argentina Adriana Marisel Zambrano.

Essa campanha é impulsionada pelo Ministério de Desenvolvimento Social e persegue o objetivo de erradicar a violência contra as mulheres, envolvendo aos homens na tarefa de transformar o machismo que para eles pode ser opressivo, enquanto que para elas pode significar a morte. Essa ação conseguiu a participação de funcionários de diferentes lugares, como o Ministro da Economia, Amado Boudu ou o titular de Aerolíneas Argentinas, Mariano Recalde; como também de outros dirigentes que, possivelmente, estejam interessados nas possibilidades de promover suas candidaturas eleitorais; porém, que, sem dúvida, contribuem para visibilizar o problema da violência de gênero devido à sua representação no âmbito político.

A campanha está conseguindo adesões em todo o país. No dia 5 de abril, Morón aderiu, conseguindo uma participação massiva. A cidadania dessa localidade ganhou mais consciência sobre as iniqüidades de gênero que o município instrumenta há anos. Nesse sentido, foi chave o envolvimento de Martín Sabatella, quando esteve na Prefeitura. Atualmente, é deputado nacional e foi quem impulsionou a adesão de Morón à campanha, conseguindo o apoio do atual chefe municipal Lucas Ghi. No ato que realizou-se na praça principal, Sabatella destacou a estratégia de comprometer os homens porque "os direitos das mulheres ou a violência contra as mulheres são temas de todas/os e a luta pela equidade permitirá construir uma sociedade distinta”.

Por outro lado, o coordenador geral da Fundação Buenos Aires Aids, Alex Freyre, uma das personalidades comprometidas com a política impulsionada pelo Ministério de Desenvolvimento Social nessa matéria, disse que no país está acontecendo uma revolução cultural e combater o machismo é parte dessa revolução. Esclareceu também que a quantidade de vítimas de violência de gênero é maior do que 260, uma vez que os registros de casos se baseiam em divulgações dos meios de comunicação. Não existem cifras oficiais sobre esse problema.

Em Morón, foram vistos ao redor de 300 homens levantando cartazes nos quais se liam os nomes e os lugares de origem das vítimas de feminicídio. O coordenador geral da Dirección de Políticas de Género do município, Leonardo Di Dio, também levantou um cartaz e assinou o documento mediante o qual os envolvidos se comprometem a lutar contra a violência de gênero e a não exercer o machismo. "Não conhecia o enfoque de gênero e o incorporei quando comecei a trabalhar na Prefeitura de Morón, em 2004; fui conhecendo o problema da violência machista ou de gênero e a novidade de impulsionar, a partir das políticas públicas, uma mudança cultural, combatendo os estereótipos e gerando condições mais equitativas para homens e mulheres”, disse o funcionário a Artemisa Notícias.

Di Dio foi percebendo que aspectos muito negativos do machismo, como a desvalorização do outro gênero, estavam condicionando seu comportamento, a começar pela piada degradante. Entendeu rapidamente que o machismo é uma forma de interpretar o mundo partilhado tanto por homens quanto por mulheres e os feminicídios são uma expressão extrema dessa perspectiva cultural, onde as mulheres são as principais vítimas. "Antes, eu pensava que os homens ocupávamos naturalmente a maioria dos postos de tomada de decisão no âmbito público e também nas empresas porque tínhamos mais méritos. Creio que a primeira coisa que devemos conseguir é reconhecer que internalizamos esses preconceitos e que, apesar de sermos conscientes de que a violência e a discriminação existem, nós mesmos reproduzimos esses comportamentos. É saudável reconhecer-se machista porque isso te permite refletir, começar a ter um olhar critico e modificar esses comportamentos. As coisas que antes eu naturalizava, agora questiono. Consegui contagiar a outros homens para que se somem a essa ideia de que a equidade de gênero trará um mundo melhor”.

Os homens que lutam contra o machismo terão benefícios porque os papeis e comportamentos a eles destinados segundo essa perspectiva cultural são opressivos. "Devemos ter coragem diante de qualquer situação ou força e não demonstrar emoções, tudo isso gera opressão”, diz o funcionário, que comemorou a realização de campanhas como a de ‘260 homens contra o machismo’, porque têm impacto público e sensibilizam à sociedade.

Não é a primeira vez que se realiza na Argentina esse tipo de ações. A convocatória da Fundação Casa Abierta María Pueblo, que recebe mulheres e crianças vítimas de violência familiar, foi pioneira, em setembro de 2010. Uns 231 homens se mobilizaram até o Obelisco em repúdio aos assassinatos de mulheres que aconteceram em 2009. Nessa oportunidade, Darío Witt, diretor da Casa Abierta María Pueblo, explicou aos meios que "os homens devemos assumir-nos como principais culpados por esse tipo de delitos”.

(fonte:www.adital.com.br)

Informe revela que a cada ano 20 mil crianças são exploradas sexualmente

Camila Queiroz

Jornalista da ADITAL

Adital

Mais de 20 mil crianças mexicanas são vítimas, anualmente, da exploração sexual originada pelo tráfico de pessoas. Os adultos também não estão imunes: apenas no Distrito Federal, cerca de 10 mil mulheres são exploradas sexualmente. Os dados constam no "Informe do Observatório contra o Tráfico de Pessoas com fins de Exploração Sexual no Distrito Federal”, apresentado ontem (25), no México.
De acordo com o relatório, o turismo sexual infantil mexicano está crescendo em cidades turísticas como Acapulco e Cancún e em cidades fronteiriças como Tijuana e Ciudad Juárez. Os locais com maior índice do delito são Distrito Federal, Baixa Califórnia, Chiapas, Guerrero, Oaxaca, Chihuahua, Tlaxcala e Quintana Roo.
A situação rendeu ao México catalogação como fonte, trânsito e destino para o tráfico de pessoas visando à exploração sexual comercial e o trabalho forçado, revelou o presidente da Comissão de Direitos Humanos do Distrito Federal (CDHDF), Luis González Placencia, citando o Escritório das Nações Unidas para o Controle de Drogas e a Prevenção do Delito e o Informe de Tráfico de Pessoas do Departamento de Estado dos Estados Unidos.

González afirmou que os grupos mais vulneráveis ao tráfico de pessoas são mulheres, crianças, indígenas e imigrantes ilegais. Acrescentou ainda que os imigrantes provêm, principalmente, da Guatemala, Honduras e El Salvador – entre 2005 e 2008, detectou-se 300 casos de tráfico de pessoas, vitimando 22 imigrantes.

Na outra ponta do ciclo da exploração, estão os principais "clientes” do turismo sexual, oriundos dos Estados Unidos, Canadá e Europa Ocidental.

"O tráfico de pessoas constitui o segundo delito mais importante desde a perspectiva da criminalidade organizada, daí que seja da maior relevância que se preste atenção a este fenômeno para que seja abatido”, declarou.

González Placencia afirmou que, segundo o Diagnóstico Ferramenta de Avaliação de Tráfico de Seres Humanos, realizado no México, há 47 bandos no país dedicados ao tráfico de pessoas para exploração sexual e do trabalho.

Dentre os fatores que impedem o combate ao crime, o presidente citou a falta de dados oficiais e confiáveis, que deixem entrever o tamanho do problema, e a não garantia de acesso à justiça e políticas públicas de atenção às vítimas. Sobre isso, ressaltou a necessidade de analisar, por meio de um trabalho de campo, todos os atores do sistema: vítimas, exploradores e clientes.

O pesquisador do Observatório, Oscar Montiel Torres, explicou que a dificuldade em erradicar esse sistema consiste na capacidade de adaptação e camuflagem dos envolvidos. Ele também fez críticas ao Programa Nacional para Prevenir e Sancionar o Tráfico de Pessoas, argumentando que a política não conta com um enfoque integral do fenômeno, nem com uma perspectiva de gênero e antidiscriminatória. Na opinião do pesquisador, é necessário se apropriar de instrumentos do direito internacional que caracterizam o tráfico de pessoas como conduta criminosa e passível de punição.

Impunidade

Apesar do número de casos de tráfico de pessoas, em 2010, apenas 40 foram investigados pela Procuradoria do Distrito Federal, e, destes, o Tribunal Superior de Justiça do Distrito Federal ditou apenas três sentenças condenatórias pelo delito.

Foram apresentadas seis investigações prévias pelo crime de Exploração Sexual Comercial Infantil (ESCI) e quatro pessoas foram condenadas.

(fonte:www.adital.com.br)